Close

Atlantique (Senegal, 2019)

Quinzenalmente, estamos aqui no Masmorra Cine, falando de filmes não-estadunidenses de uma forma que cabe no seu tempo e, de quebra, apresentando dicas culturais oriundas dos países das obras destacadas. Venha conosco. Hoje, iremos ao Senegal.

 

         Carvalho de Mendonça

 

        

ATLANTIQUE (Senegal, 2019)

Atlantics – Drama/Realismo Fantástico – 1h47min – Mati Diop

A obra em 8 segundos

Por uma vida melhor, operários senegaleses tentam atravessar o oceano até à Europa. A travessia é interrompida por uma tragédia, mas algo sobrenatural subverte o destino de todos.

***

A obra em 57 segundos

Por uma vida melhor, operários senegaleses tentam atravessar o oceano até à Europa, mas a travessia é interrompida por uma tragédia. Um deles é Souleiman (Ibrahima Traoré), jovem que vive um romance com Ada (Mame Bineta Sane), garota pobre que está prometida em casamento a Omar (Babacar Sylla), um figurão do local, herdeiro de grande fortuna e sonho matrimonial de todas as mulheres da região (exceto de Ada). A moça, que já era infeliz devido ao enlace forçado e ao romance secreto, sofre um abalo inesperado com o desaparecimento do amante no mar, mas algo sobrenatural subverte o destino de todos. A direção de Mati Diop é especial e a utilização do realismo fantástico para fazer crítica social é acertadíssima. O clima onírico impresso na relação entre os personagens, e na relação destes com o mar, é poderoso. Em contrapartida, o roteiro é confuso, deixando algumas passagens ininteligíveis e totalmente dispensáveis. A protagonista faz um trabalho brilhante e carrega a trama com maestria.

*** 

A obra em 2 minutos e 34 segundos

Em Dakar, capital do Senegal, uma torre de estilo futurista está sendo construída para abrigar um luxuoso shopping center. No canteiro de obras, porém, os operários não recebem suas remunerações há quatro meses. Arrimos de família, alguns deles contraíram enormes dívidas para patrocinar o seu sustento e de seus dependentes, resultando, inclusive, em ameaças por parte de agiotas. Em busca de uma saída, eles usam um barco para tentar atravessar o oceano e chegar à Espanha, mas a viagem é interrompida por uma tragédia.

Um dos operários é Souleiman (Ibrahima Traoré), jovem que vive um romance com Ada (Mame Bineta Sane), garota pobre que está prometida em casamento a Omar (Babacar Sylla), um figurão do local, herdeiro de grande fortuna e sonho matrimonial de todas as mulheres da região (exceto de Ada). A moça, que já era infeliz devido ao enlace forçado e ao romance secreto, sofre um abalo inesperado com o desaparecimento do amante no mar, pois sequer sabia da viagem do amado. Porém, o sol se põe, a lua surge, e traz com ela o sobrenatural, que subverte toda a história, inclusive o gênero do filme.

Atlantique é a primeira experiência na direção de longa metragem da cineasta francesa Mati Diop, e, logo na estreia, ela já foi selecionada para concorrer a Palma de Ouro em Cannes, bem como a película já se tornou um dos exemplares mais procurados da Netflix. A direção de Diop é realmente especial. O clima onírico impresso na relação entre os personagens, e na relação destes com o mar, é poderoso e competente ao seduzir o público. Em contrapartida, o roteiro é confuso, deixando algumas passagens ininteligíveis e totalmente dispensáveis.

Apesar disso, um aspecto que merece ser ressaltado no trabalho da diretora é a seleção de elenco. Formado por atores e atrizes locais, o grupo é homogêneo, com coadjuvantes simpáticos, e uma protagonista potente, que domina a tela e carrega a trama com maestria. Com uma construção precisa de Mame Bineta Sane, Ada representa o espectador no caminho surreal desenhado pelo filme, partindo do amor romântico proibido, passando pelo julgamento social, policial e religioso, chegando ao desfecho fantástico, sobrenatural, absurdo, comovente.

Atlantique usa o realismo mágico para fazer crítica social. O método não é novo, mas é raro no cinema, principalmente nos dias atuais. Muito forte na literatura latino-americana, o gênero também possui a sua vertente na África, com ângulos distintos, chamado pelo escritor angolano Pepetela de “realismo animista”. Aqui, a exploração pelas grandes corporações, a submissão feminina em povos religiosos, o problema dos refugiados (e as constantes mortes no mar), estão poeticamente margeados pela fantasia, e desenhados pela sensível lente de Mati Diop.

Ponto forte: Realismo fantástico utilizado em favor de crítica social.

Ponto fraco: Roteiro é problemático, o que enfraquece o todo e torna a obra um pouco confusa, com passagens aleatórias e nada coesas.

***        

Ficha Técnica

Direção de Mati Diop

Roteiro de Mati Diop e Olivier Demangel

Produção de Judite Lou Lévy e Eve Robin

Elenco principal com Mame Bineta Sane, Amadou Mbow, Ibrahima Traoré, Nicole Saugou, Animata Kane, Babacar Sylla, Mariama Gassama, Ibrahima Mbaye e Diankou Sembene

Fotografia de Claire Mathon

Edição de Ael Dallier Vega

Figurino de Salimata Ndiaye e Rachel Raoult

Trilha Sonora de Fatima Al Qadiri

***

Dica cultural, diretamente de Senegal

A dica cultural de hoje é o som do grupo senegalês Orchestra Baobab. Mantendo quase a mesma formação desde o início, a banda está junto há quase 50 anos, sendo que nos anos 70, chegou a ser considerada a principal representante da música no país. Dono de um swing incrível, o conjunto faz uma interessante composição de instrumentos, criando um som que transita entre ritmos populares africanos e a música cubana. A vasta discografia da Orchestra Baobab merece ser visitada e revisitada sempre.

Por hoje, é isso, companheiras e companheiros.

Até mais.

Carvalho de Mendonça

Leave a reply

Archives

Categories